19 de jul. de 2009

Réquiem para minha dor


John Atkinson

Réquiem para minha dor

Vieste para mim quando o amor se foi.
Ocupaste o lugar de quem tantas vezes
sentiu comigo a brisa acariciando a pele
e levando o nosso cheiro para alem dos ares.

Foste a companheira da minh'alma
e, ao me fazer chorar, eras também
o alento, o alimento, o remédio,
o conforto, enfim, o que restou.

O dia amanheceu sombrio, com cor de despedida.
Nunca mais verás minhas lágrimas cairem,
nem ouvirás a tristeza do meu cantar.

E hoje, no dia do teu fim, estou contigo...
Desfaço-me de ti, antes que tu me convenças
a me desfazer de MIM, por não mais te suportar.

Regina Helena

Poesia sem Verbo


Tela John Atkinson

nas linhas da vida,
o tempo da morte!
soluços, lágrimas...
restos de amor...

na manhã de dor
de tudo o fim
o fim da esperança:
- retalhos do adeus.

no chão orvalhado
de dor e de pranto,
do triste caminho,

o fim da estrada!
consumado o fato:
agora... a saudade!

Regina Helena

Tela de John Atkinson

Sou um NADA!
assim me vejo,
assim me sinto!
faço de TUDO mas...
não sou mestre em NADA!
um dia faço poesia
no outro sou artesã
e sinto que
poderia até pintar...
e nessas horas,
penso que sou TUDO!

Então, a realidade se impõe
e, de repente,
volto a ser NADA!
Um NADA que se dissolve
na alegria da vida,
nas dores, no sofrimento,
na mesmice da condição humana,
do poder fazer, executar,
decidir...
e, nesse momento,
volto a ser TUDO outra vez.


Regina Helena

OUSADIA


Tela: John Atkinson

OUSADIA

Na ânsia de atingir o ignorado
Vai-se o tempo voraz, audacioso
Nas brumas de um enigma mergulhado
Não para de correr, misterioso.

Qual rio a transbordar agigantado
Investe sem cessar, tempestuoso,
Contra tudo que atira no passado
No mais terrível gesto, corajoso.

Com ele tudo passa: a dor, a vida
A alegria, o amor, as esperanças
No arrojo invulgar desta corrida.

Não olha para trás nem retrocede...
E vai deixando apenas as lembranças...
. . . Como quem parte que não se despede!

Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)

INQUIETUDE


INQUIETUDE

Tarde cálida e mórbida... Angustiante...
Um silêncio mortal. Nem uma voz
Levanta-se no vácuo. Torturante
O ar pesado paira sobre nos.

O calor abrasado, sufocante
Já me importuna de maneira atroz
E nesta alegoria delirante
Triste lembrança se me faz algoz.

Dentro em meu peito, o coração soluça!
E genuflexo triste se debruça
Sobre um passado que já vai distante.

Chora contrito uma recordação,
Revive um sonho que perdido em vão
Pra mim tornou-se um padecer constante.

Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)

DERRADEIRA SAUDADE


Tela do Pino

DERRADEIRA SAUDADE

PAIXÃO fugaz... Ventura passageira...
Rosa que não colhemos da roseira,
Mas que esteve, no galho, ao nosso alcance.
Ah! Quanta vez, num desespero mudo,
Eu quedo-me a cismar naquilo tudo,
Que encheu de sol nosso cruel romance!

Bendigo ainda os beijos que maldizes,
Que abriram na minh’alma cicatrizes,
Que encheram de ambrosias nossa boca;
Só me consola, nesta dor pungente,
Lembrar que te adorei perdidamente,
Lembrar que me adoraste como louca!

Mudaste muito, eu sei... Mas, com certeza,
Nas horas de saudade e de tristeza,
Em que a alma chora e o coração nos trai,
Hás de pensar em mim de quando em quando,
Com lágrimas nos olhos relembrando
- Toda essa história que tão longe vai!

Paulo Setúbal

Só tu


Tela do Pino

Só tu

Dos lábios que me beijaram,
Dos braços que me abraçaram,
Já não me lembro, nem sei...
São tantas as que me amaram!
São tantas as que eu amei!

Mas tu - que rude contraste! –
Tu, que jamais me beijaste,
Tu, que jamais abracei,
S6 tu, nest'alma, ficaste,
De todas as que eu amei.

Paulo Setúbal

12 de jul. de 2009





PRETO JOVÊNCIO, O VAQUEIRO

Cem longos anos
O Preto Jovêncio tem
Mas como ele consegue
Ser jovem como ninguém
É verdadeiro mistério
Que descobrir convém

Ele foi menino forte
Desde cedo trabalhou
E mesmo ainda miúdo
Sua profissão abraçou
E no mais famoso vaqueiro
Do Marajó se tornou

Ao longo de sua vida
O medo não lhe rondou
Ganhou muita corrida
Nos cavalos que montou
E derrubou touro brabo
Que nos campos campeou

E pelas ruas de Soure
Esta tão bela cidade
Tem a figura singela
Que lhe trás felicidade
Pois o vaqueiro mais forte
Aqui em muita amizade

Quando na rua ele passa
Cumprimenta todos que vê
E também é cumprimentado
Por quem quer lhe conhecer
Para saber da história
De tão longo bem viver

Se o ser humano busca
A sonhada longevidade
Não precisa de mistério
Só de Deus a caridade
E um monte de amigos
Que lhe dê felicidade

Passar o dia trabalhando
E toda noite dormindo
É apenas uma das formas
Para se manter menino
Mas se quiser coma turu
No seu lanche matutino

E assim vamos vivendo
Sem com ninguém se zangar
Nunca guardando ódio
E tendo sempre a quem amar
Pois com o caldo de turu
A energia vai lhe sobrar.

Tarciso coelho

7 de jul. de 2009

Imagem do blog "doce deleite"

Hoje estive vendo a Mila Ramos e fiquei profundamente impressionada com suas palavras sobre a famigerada “farra do boi” de Santa Catarina. Deus do Ceu. São extremos de crueldade com os pobres animais que são tão meigos.

Detive-me pouco no sofrimento, porque minha mente amiga me desviou para lembranças agradáveis. Lembrei-me do nosso pai. Muitos filhos, treze ao todo, impossível que vivêssemos no maior silêncio e harmonia. A gente brigava, claro. Todo irmão briga!

Por muitas vezes nosso pai entrava em casa e nos via no meio de uma “batalha” e nossa mãe chorando. E ele se saia como uma até engraçada:

- Vocês já viram um boi lambendo o bezerro?

Claro que ninguém tinha visto. Então ele completava:

- Cuidem da mãe de vocês, parem de dar preocupação a ela. Se ela morrer, não vai ter quem passe a mão na cabeça de vocês!

Tão bom pai ele era que “lambeu” as crias até o fim. Mas gostava de deixar só com nossa mãe esse crédito.

Regina Helena

5 de jul. de 2009

SÓ SONETOS DE PATRÍCIA NEME


ADÁGIO

Enterro os sonhos meus e a esperança,
guardados, desde a infância, no florir
da rosa branca, em pencas de lembrança...
Em cachos do que foi o meu sorrir.

Roseiras com ternura de criança,
no vasto verdejar de um existir
sedento de carinho e segurança,
com sede de encontrar-me em teu sentir.

Mas já não mais percorres meu jardim,
teus passos vão tão longe.. E vão sem mim...
Eu morro a cada instante... E morro só!

Enterro os sonhos meus... E a minha vida,
agora, só rosas de despedida...
Só pranto.... Nada mais que pranto e dó!

- Patricia Neme –

EXPLICITAMENTE

Quero abraçar-te e ao som da lua, amar-te...
Sentir em mim, estrelas a cantar;
e o sol rompendo no meu ventre... Dar-te!
E no teu beijo, infinitos tocar.

Com meu desejo, quero afoguear-te
e ver-te em vôo bem além do mar...
Em teu sussurro, perder-te e encontrar-te
e contemplar teu corpo a se entregar.

Quero, desejo... Emoções pungentes...
Frêmito, anseios, todos tão plangentes...
Tu me desarmas dos temores meus.

E o pensamento, Deus que gran tormento...
E esta distância... Que não mais agüento...
Os meus sonhares buscam pelos teus.

- Patrícia Neme –

PASTOREIO

Sou a pastora de mil andorinhas,
aves perdidas em teu denso olhar;
quero poupá-las de ilusões daninhas,
mas elas voam... E te vão buscar.

Tão delicadas, frágeis, pequeninhas...
Tão fascinadas pelo teu mirar...
Sonhos que anseiam ser as entrelinhas
do amor suposto no teu versejar.

E eu pastoreio, busco-as, noite e dia...
Mas são reféns da etérea melodia,
do encantamento, vindo do teu ser.

Asas abertas, alma entregue, inteira...
Seguem viagem, que sei derradeira...
Pois em tuas mãos, irão morrer... Morrer...

- Patricia Neme-

ENTRE AS ESTRELAS...

Na vastidão do templo constelado,
onde a visão do espírito é presente,
o livro da verdade é desfolhado...
E conta da lembrança que há na mente.

E narra cada estrada do passado,
desnuda o véu que encobre o sol nascente
de todo sonho, em sono acalentado,
de cada anseio, mesmo que latente.

No mais além desta humana existência,
só onde o amor alcança a transcendência,
o renascer, enfim, é revelado.

Então, já nada resta do ilusório,
já nada resta deste purgatório
que é ser... Sem vislumbrar o nosso amado!

- Patricia Neme –

Sim?

Eu quero o teu sorriso nos meus olhos
e a cor do meu desejo no teu rosto.
O teu pensar guardado em meus cabelos,
minh'alma em teu cantar, ao mundo exposto.

Eu quero o meu silêncio no teu riso,
teu coração pulsando no meu peito;
nossos murmúrios soltos no infinito...
E a lua se aninhando em nosso leito.

Quero sentir no corpo o teu afago,
tu'alma aconchegada em meu carinho;
eu quero em nós a paz das borboletas...
E o amor a nos ninar, bem de mansinho.

Em ti quero sentir a eternidade,
que em mim ancores dores do passado;
e quando esta existência tiver fim...
Que nós a terminemos lado a lado.

Se o céu, ao meu desejo, diz amém?
Dirá, se assim quiseres tu também!

- Patricia Neme –

ENGANO

Eu te percebo em vôo errante e vago,
cortejas flores, rondas os canteiros.
Perdido em cores, bebes, trago a trago,
orvalho e néctar, vãos e derradeiros.

Beijas a rosa, no cravo um afago...
Mas teus carinhos não são verdadeiros.
Teu rastro fala de dor e de estrago,
dos sonhos mortos... Todos passageiros!

Teus passos são volúveis, causam dano,
motivam pranto, angústia, desengano,
desfolhas vidas, sem pena, sem dó.

Tanta aridez... O que é do meu jardim?
Eu me pergunto, o que será de mim...
Assim tão triste, machucada e só!

- Patricia Neme –

QUERO...

Quero tão pouco... Só teu colo... Um aconchego...
Poder contar-te de minh'alma, dos meus sonhos;
ter em teus braços o nascer do meu sossego,
em teu olhar perder meus dias enfadonhos.

Sentir tuas mãos em meu cabelo... Teu chamego...
Já não lembrar-me dos momentos tão tristonhos.
Estar em ti, mente liberta desse apego
aos meus conceitos... E viver por entressonhos.

Eu me declaro, te suplico, vem a mim,
vive comigo essa loucura, tão sem fim...
E sê bem mais do que já és: minha razão.

Sê para mim a origem pura dos meus versos...
Pra que eu não viva em vãos pedaços... Vãos... dispersos...
Para que, enfim, em ti eu encontre porto e chão!

- Patricia Neme –

ENCONTRO

Sente minh'alma, o corpo... Ouve a esperança
de um amanhã sem medos, sem pecado.
Sente o desejo, a entrega e o amor que alcança
os sonhos de um sonhar jamais sonhado.

Sente o lembrar perdido na lembrança,
cantado pelas brumas do passado.
Perscruta além do véu... Então, alcança
a trama entrelaçada pelo fado.

Sou tua; há eternidades tu és meu...
Desde o princípio em que nos concebeu,
o céu nos destinou a mesma estrada.

E a noite... Uma só tenda... Uma fogueira...
E uma paixão, qual fora a vez primeira...
No encontro... Na explosão de uma alvorada!

- Patricia Neme –

PROCURA

A música distante.. É triste... Chora...
A lua... Sonhos, tantos... Solidão...
Palavras, sentimentos... Tudo implora
por ter nova esperança, novo chão.

Vazio... Alma apagada... É lenta a hora...
É lento o amanhecer do coração.
O sol... O sol, não vem... O sol, demora...
E a dor demarca os passos da emoção.

Qual folha que se vai na tempestade,
minh'alma peregrina na saudade,
saudade... Que não mostra o seu olhar.

De quem? Não sei... Mas sofro, sem medida...
Aqui... No outrora... Eu busco minha vida,
rogando ao céu um dia te encontrar!

- Patricia Neme –

RENASCER

No teu olhar vejo prenúncio de alvorada,
canto de pássaros... O sol... A brisa amena...
A relva verde... O rio manso... Até a estrada
de onde a esperança, enternecida, a mim, acena.

No teu olhar de mil paixões... Ventura plena?
Perco meu norte... Sou quem sou... Ou não sou nada?
Olhos que juram vida em paz, simples, serena...
E me sussurram aventura não pensada.

No teu olhar... Sonho... Delírio... Insanidade?
Como saber se és ilusão... Ou se és verdade?
Se creio, arrisco... Se desisto... O que fazer?

Como eu quisera mergulhar nessa promessa
e palmilhar teu coração, sem medo ou pressa...
No teu olhar, viver, morrer... E renascer!

- Patricia Neme –

ADEUS...

O adeus é vendaval, tudo embaralha...
Quem fica perde o rumo, o tino e o chão.
É como andar no corte da navalha,
sem conhecer aonde os passos vão.

No adeus, o coração tem a mortalha
e a alma se consome em solidão.
E o amor em mil lembranças se agasalha...
E o sonho se despede da emoção!

Oh, Deus, é tanta a dor que há na partida,
quem fica não mais quer a própria vida,
quem parte, leva a vida que ficou...

E os dias são tristeza e nostalgia...
E as noites um vazio... Uma agonia...
Adeus é uma esperança... Que findou!


- Patrícia Neme -

Resposta à Oitava Rosa de Sarom

Morrer? Jamais... Se eu sou a luz da aurora,
a iluminar o olhar do roseiral;
em mim, uma esperança que se ancora
nos versos desse amor, já outonal.

Morrer? Não há de ser hoje, ou agora.
Sou rio a tranbordar-me num caudal
da vida, que, em semente, a terra implora,
para expandir-se além do bem, do mal.

Em cada semear, sou infinita
e pelo meu Senhor, sempre bendita...
Se morro, a melodia perde o tom.

Então, supero o ciclo da existência
e vivo no acolher da transcendência...
Que me faz ser a Rosa de Sarom!

- Patricia Neme –

Resposta à Sétima Rosa de Sarom

Eis que te bato à porta, amado meu,
para entregar-me, em alma e coração;
para dizer-te: a fé jamais morreu,
nos versos que me deste por canção.

Em mim, sequer um dia feneceu,
a espera, o amor e o canto da paixão;
o credo em quem teceu o que sou eu...
E nos uniu por graça e compaixão.

Porque somente Deus, pai generoso,
pode nos conceder chão tão ditoso,
que acolha o renascer de nossas rosas.

E juntos, na justiça da equidade,
semearemos paz, fraternidade,
em pétalas de luzes caridosas!

- Patricia Neme –

RESSURREIÇÃO

Levanta, meu Jesus, em Luz e Glória,
sobre este chão Teu rosto resplandeça;
levanta do sepulcro e muda a história
desta Nação, que jaz em treva espessa.

Nossa cidadania é ilusória,
horas de paz... Não há quem as conheça!
Pela moral vivemos luta inglória...
Não deixa que Teu povo assim padeça!

Se Páscoa é vida encarcerando a morte,
que Teu ressuscitar nos reconforte,
que nos resgate o sangue da Paixão.

Só Tu, filho de Deus, és nosso alento!
Sobre o Brasil semeia o Avivamento,
para que, enfim, tenhamos redenção!

- Patricia Neme –

O AMOR AINDA SOBREVIVE AO TEMPO

Não há no Tempo o bálsamo perfeito
para amainar a dor de uma saudade;
para apagar o amor que jaz no peito
de quem pensou haver fidelidade

na voz gentil, no olhar, no meigo jeito
dos versos celebrando a eternidade
do bem querer em flor. Amor-perfeito
em rimas de promessas sem verdade.

O Tempo... Ah! Esse Tempo que não finda
toda paixão que me acalenta, ainda...
E embala meu sonhar em vão lamento!

Nem Tempo ou novo alguém têm a magia
que faz adormecer a nostalgia
deste sentir jogado ao léu, ao vento!

Patrícia Neme

'O mar e a Rocha'

O mar se entrega à rocha sem receios
e a cobre com espuma virginal.
E lhe acarinha todos os permeios,
e a ama, como nunca amou igual.

Lhe conta dos seus mais sutis anseios,
lhe fala desse amor, já outonal...
E a cerca com seus mil e um meneios...
E lhe oferece todo o seu caudal.

Porém, sempre centrada em sua essência,
ela não se permite a experiência
de se entregar aos braços desse amor.

E perde um oceano de venturas,
e mais e mais conhece as amarguras,
de quem jamais permite su'alma expor!

-Patricia Neme –

QUERO...

Quero tu'a alma... E não retruques nada!
Tu'alma, de presente, na bandeja.
Se inteira, ou mesmo que despedaçada,
a mim, pouco me importa como esteja.

Quero beber tua lágrima cansada,
quero o sorriso que em teu ser viceja.
Te quero... Dia, noite ou madrugada...
Te quero, tal qual és... E que assim seja!

Se o tempo nos roubou a juventude,
deixou-nos, de lembrança, uma virtude:
reconhecer um chão onde há valor.

Te quero, mesmo ralo o teu cabelo...
Aceita... Embora as rugas, meu desvelo...
Te quero... Para dar-te o meu amor

- Patricia Neme –

A VALSA

Ele veio silente, o luar a trazê-lo,
um sorriso fagueiro reinando no olhar.
“Uma valsa? “, propôs. Aceitei seu apelo...
- Todo baile eu ousara tal gesto esperar.

Abraçou-me a cintura, com terno desvelo,
tal se eu fora cristal do mais fino vibrar.
Em meu peito a ventura de, enfim, conhecê-lo,
me fez leve qual brisa soprada do mar.

Ante o chão carpetado com gotas de orvalho,
o céu pleno de estrelas, num rútilo pálio...
conivente, o destino, o relógio parou.

Entre beijos, promessas... Ditosa loucura!,
todo o amor que eu vivi, desde sempre, à procura,
na magia dos sonhos comigo bailou!

Patricia Neme

DESEJO
(na inspiração de um soneto imperfeito)

E quando os olhos teus beijam meu corpo,
trazendo, à minha noite, a luz d´aurora,
e as tuas mãos percorrem meus segredos...
Todo um desejo ardente em mim aflora.

E quando teu respiro me entontece,
e o teu gemido por entrega implora,
teu cheiro, forte, macho, me abre os poros,
endoidecida, rogo: Vem, agora!...

Todo universo dorme em alva cama,
onde o sentir se faz perene e clama
pelo arquejar das forças animais.

Um gozo, tanto, explode em liberdade,
nos faz trilhar o chão da eternidade...
E, num rugir supremo, eu peço “Mais!”

- Patricia Neme –

COMUNIO

Que, hoje, eu comungue do sofrer do nordestino,
a quem a terra nega um prato de comida.
Que eu sinta a dor de quem, na vida, é clandestino,
pois, por um vírus, faz-se gente preterida.

Que eu seja amparo da mulher em desatino,
em prol dos homens sempre usada, consumida;
e dos menores marginais, cujo destino
é morte inglória, cova rasa, alma perdida.

Que em comunhão com o universo brasileiro
- tão desprovido do direito verdadeiro -
eu me transmute em cada irmão sofrido, exangue.

Somente assim, meu Deus, terei merecimento,
(pois do lutar por igualdade não me isento)
de receber em Comunhão Teu corpo e sangue.

- Patricia Neme –

'A Quinta Rosa'

Senhor da minha vida e minha morte,
estrela dos segredos da manhã...
Por onde a rosa que me alumbra a sorte?
Por onde a rosa amiga, amante, irmã?

Nos campos de Saron... Ao sul? Ao norte?
No altar que abriga o culto à fé cristã?
Talvez, onde o pajé seu canto aporte...
Ou há de estar nos céus de Aldebarán?

Na quinta rosa, onde tenho ascendência,
e sou mestra perfeita em plena essência...
A vida exulta em mim todo o fulgor.

A quinta rosa... É tudo o que eu anseio,
não mais falsa esperança ou devaneio...
Enfim, ser conquistada pelo amor.


- Patricia Neme –

Mas o que é o amor?

Talvez brisa sutil, cujo toque acalanta
a roseira a florir, em promessa de vida...
Ou será minuano, que, hostil, aquebranta
a palmeira que, em prece, se eleva, incontida?

Arrebenta, revira, destroça, desplanta...
Há de ser vendaval, em loucura homicida?
Ou, bem mais, tempestade, que o peito agiganta
e desperta o queimor da paixão reprimida?

Ah, o amor! Explicá-lo é tarefa impossível...
As lembranças sussurram baixinho: é factível...
Tomo lápis, papel, e me entrego ao labor.

Um silêncio... Saudade... Uma lua tão cheia...
E o poeta que, errante, em minh´alma vagueia,
um soneto plangente começa a compor!


- Patricia Neme –

'A UM POETA'

Quem é esse que, em versos, minh´alma desperta
e que a faz se perder em mil tramas de amor?
Como pode entender a carência encoberta
e meu sonho mais caro em soneto compor?

Quem me vê tão desnuda e nas rimas me oferta
os anseios perdidos nas brumas da dor?
Quem me sabe encontrar de maneira tão certa...
quando eu não mais ousava venturas supor?

Quem me faz suspirar, quem meu peito acelera,
onde está esse alguém, que me exila na espera...
No desejo, saudade... onde achá-lo, afinal?

Ah!, Poeta... Eu quisera de ti ser a musa,
em teus braços viver para sempre reclusa,
embalada ao cantar de gentil madrigal!

Patrícia Neme