Seja bem-vindo. Hoje é

15 de jul. de 2024

POESIA COTIDIANA – Apresentação


    Para se fazer poesia, é necessário amar poesia. Isso porque, ao fazê-la, o poeta se mostra por inteiro, se desnuda de todo temor, e até mesmo dos pudores que nos são impostos pelas convenções sociais. Sim, é despir-se, porque a produção do poema nem sempre é ato de construção, mas, e na maioria das vezes, um gesto de entrega ou de permissão para que o poema brote livre e irrefreável, como um rebento que a parturiente não pode impedir que venha ao mundo, como o sol renitente que segue seu trajeto independentemente da permissão de quem quer que seja. Nesse processo quase que automático, o poeta deixa escapar involuntariamente a sua identidade, seus medos, suas alegrias, seus anseios, suas preferências estilísticas, sua essência, sua alma. Por isso o desnudar-se, o despir-se por inteiro. 
    Ler a poesia de Tarciso Coelho me fez lembrar Manoel Bandeira, não pela forma ou pela temática, mas pela fidelidade ao cotidiano do poeta, pela veracidade da mensagem, se é que se pode falar de mensagem em poesia – cada leitor faz a sua e ninguém é louco de dizer o contrário. Por falar em Bandeira, veio-me à mente o poema Desencanto, do qual transcrevo a seguir um pequeno fragmento: 

Eu faço versos como quem chora
De desalento. . . de desencanto. . .   
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

– Eu faço versos como quem morre.


       Quanto antagonismo meu!... pois Tarciso não faz verso como quem chora de desalento ou de desencanto, mas como quem sorri para a vida e vive intensa e descontraidamente cada momento. Não faz versos como quem morre, mas como quem vive plenamente, tem sede de viver, de irradiar vitalidade. Não sei exatamente por que lembrei de Bandeira, um dos inventores do modernismo brasileiro, com rimas livres ou sem nenhuma rima, mas com uma autenticidade inigualável. Já o poeta Tarciso faz uma poesia bem diversa da de Bandeira, faz cordel, mas às vezes com rimas livres e sem escravizar-se à métrica ou ao ritmo, porém igualmente autêntico. Talvez seja isso: a autenticidade, que parece uma forte influência de Patativa do Assaré, a quem o poeta homenageia, ao tempo em que louva também mestre Tomás, dois gigantes da cultura e da sabedoria popular. Assim, caminhando pela vida cotidiana, Tarciso vai expondo sua alma, e dando pistas de sua identidade de poeta, em uma temática variável e abrangente: do amor familiar ao carnal, do ambiente de trabalho ao ambiente boêmio, da cultura nordestina à nortista (marajoara), das relações de amizade às manifestações humorísticas, com seus personagens bem populares, com o folclore, ou seja, com tudo que está no seu repertório e na sua alma, mas que está também na alma do povo, no imaginário popular.
No que se refere aos Causos e Causas, ah!... estes são um “causo” à parte. Nestes o agora prosador, e prosista, no dizer do povo, traz fatos e personagens com os quais a maioria de nós já conviveu, ou pelo menos conheceu; fatos pitorescos, cotidianos, personagens irreverentes, talvez aquela irreverência com a qual todos sonhamos um dia. E vai, assim, tecendo as pequenas tramas recheadas de humor e graça, uma graça suave e leve, própria dos bons cronistas. Era isso!... Tarciso é também um cronista, contador de causos, de coisas, de fatos e anedotas que nos alumbram e nos assustam, mas que fazem um um bem danado à nossa alma.

                                                                                          Luiz Egito de Souza Barros
                                                                            Professor e, nas horas vagas, poeta e prosador. 

3 de jul. de 2024

Marcelo Santos Lima (Marcelão do Basa)

É com grande alegria que compartilho essa lembrança, revisitada e aprimorada, de nossos anos no Banco da Amazônia em Soure (PA). De 2005 a 2011, tive a honra de ser seu colega como Técnico Bancário, enquanto você brilhava como Engenheiro Agrônomo e Técnico Científico. Aos 70 anos, posso afirmar com segurança que tenho muitos bons amigos espalhados pelo Brasil, mas você, Marcelo, ocupa um lugar especial no meu coração.

Em cada local de trabalho, sempre elegi aquele colega que me enche de orgulho e a quem posso chamar de melhor amigo. No Banco da Amazônia em Soure, essa pessoa foi você. Já se passaram 13 anos desde que deixei Soure para retornar ao Banco do Brasil, mas nossa amizade permanece forte. Continuamos nos comunicando e nos encontramos sempre que retorno a Soure. Sou também amigo de sua família, o que só fortalece nossos laços. Outro dia, no Terminal Hidroviário de Belém, encontrei sua esposa Iris, e tivemos uma agradável conversa.

Você é testemunha ocular e auditiva de muitos dos causos que vivi. Sempre que possível, nos reuníamos para tomar umas geladas, lubrificando os pensamentos e molhando a palavra para os melhores bate-papos. Muitas vezes, estávamos na companhia de amigos como Seu Milton Emílio, João Broa, Paparazzo, Braga, Selva, Montanha e muitos outros.

Lembro-me de uma vez, ao retornar de férias, que nos encontramos no Restaurante de Dona Mariazinha. Era um sábado, por volta das 11h da manhã. Começamos a tomar umas e, de bar em bar, a jornada se estendeu até a madrugada de domingo. Então, você disse: “Tá bom da gente parar, pois quanto mais bebemos mais a cerveja fica gostosa”. Concordei, e hoje arrisco dizer que não era só a cerveja que ficava melhor, mas também nossas conversas, sempre agradáveis, inteligentes e fluídas.

Na última vez que fui a Soure, o convidei para tomar umas e você recusou, dizendo que estava apenas tomando água mineral, e sem gás. Você deu alguns motivos para essa mudança, que não vale a pena detalhar aqui. Digo apenas que não foi por problemas de saúde, já que você continua sendo o mesmo Marcelão de outrora.

A amizade do Marcelo, é uma joia preciosa que guardo com carinho. Obrigado por todos os momentos compartilhados, pelas risadas e pelas conversas que tornaram nossas vidas mais ricas e cheias de significado.

Gratidão.






César (Papagaio)



César e Tereza, era um casal do tipo em que pensávamos, viverão juntos para sempre. Tocavam o Bar do Papagaio que, o dono dizia: “Bar do César”, mas não convencia ninguém. A cidade inteira só ia ao Bar do Papagaio. E lá nem estava a bela avezinha palradora. O César é que tinha mesmo uns ares de papagaio. Um dia Dona Tereza estava sobre um banquinho amarrando uma caixa de som no alto de um esteio e um freguês insistente pedia uma cerveja. Ela disse: “Calma rapaz, você não está vendo que estou trepando?” (se referia a estar trepando no banquinho para fixar no alto a caixa de som). Outro freguês mais saliente, disse: “Já que o Papagaio não trepa, né Dona Tereza?). Risada geral. 

O ambiente era sempre alegre e cheio de descontração, um espaço democrático digno dos melhores barzinhos. Nem sei como não me tornei viciado, não só no álcool, mas nas alegrias inusitadas que proporcionam tais lugares.

O Papagaio, fiel companheiro, começou a dar umas saídas sem prévio aviso e a se demorar mais que de costume. Dona Tereza, que colocava a mão no fogo quando o assunto era a fidelidade de seu amado, começou a ter uma leve desconfiança. Por via das dúvidas, um dia seguiu de forma imperceptível o seu amado pelas longas e tranquilas ruas até vê-lo entrar numa casa, longe de desconfiar que estava sendo observado. Ela deu um tempo até que bateu na porta. Quem a recebeu foi o Papagaio com um papeiro nas mãos, esfriando o mingau do bebê que se esgoelava de fome nos braços de sua nova amada. Estava armado o barraco, mas depois foi o assunto superado por todos.

Da última vez que encontrei o Papagaio ele me disse que a união foi desfeita mas que são bons amigos.






Sabá (Barbeiro)



De saudosa memória, o amigo Sabá cobrava R$ 3,00 por corte de cabelo e R$ 2,00 por corte de barba, cujo valor se mantinha há mais de 10 anos. Sempre paguei um pouco mais e um dia perguntei porque ele não reajustava esses valores. Ele disse: “É que tem dado pra viver e não quero afastar meus clientes”.

Sua humilde barbearia, só uma porta, não era constantemente demandada e para não ficar sem fazer nada, ele ficava horas na calçada tecendo redes de pesca, com uma agilidade de hábil artesão, juntando gente para assistir o surgimento de novas malhadeiras, as quais eram vendidas a bom preço na colônia de pescadores. De tanto ver, até ensaiei fazer umas redes mas logo percebi que não seria um bom tecelão e desisti.   

Uma vez perguntei se ele era pescador pra ter tanta habilidade na confecção das redes. E ele honestamente, nem precisava entrar em detalhes, disse que não e completou: “Sou uma pessoa honesta e o único sentimento de culpa que tenho e receber o seguro defeso sem ser pescador”. Como não sou de julgar ou culpar as pessoas e para diminuir o peso de sua consciência, brinquei: Você não está errado. O seguro é pago para que os pescadores não pesquem em determinado período de crescimento dos peixes e você não pesca nem quando é permitido pescar. Os peixinhos e os peixões lhe agradecem. Rimos. 






Anilson Conceição (Cachorra)

O amigo Cachorra é um pacato cidadão Sourense, pai de família, trabalhador, bem humorado e amigo de todos. Porém não perde uma oportunidade de fazer uns gracejos ou cachorradas, daí advindo o sugestivo apelido.

Quando ele gerenciava uma pousada da cidade cheguei à noite para me hospedar com uma namorada furtiva. Ele bem discreto, me entregou a chave, indicou o apartamento e por fim, mesmo na presença da bela jovem, perguntou-me: Posso ir junto? 

Outra vez fiz uma refeição no restaurante da pousada e fui pagar a conta com uma cédula graúda. Ele me devolveu a cédula e disse: “Me dê trocado que é mais sexy”.

As vezes o encontramos sentado no colo de algum homem ou até mesmo simulando um beijo na boca (mas põe a mão entre as bocas para não encostar os lábios. Fico em dúvida se não beijaria pra valer se ninguém tivesse vendo. Sei não.

Da última vez que fui á Soure, quando o encontrei, ele com a alegria de sempre ao me cumprimentar, perguntou quando eu iria embora. Sabendo que não ficaria impune, arrisquei: só depois que namorar. Ele: Pois se o namoro for comigo você já vai embora hoje. 

Quando vai na garupa de moto taxi põe as duas pernas pro mesmo lado e se agarra no pescoço do moto taxista até o final da viagem.

Se liga pra alguém e não tem a voz reconhecida e perguntam quem fala? Ele responde: 

“Sou eu, o melhor amigo do homem”. 

Existem várias outras histórias “homossexuais” desse “melhor amigo do homem”. Mas por serem impublicáveis deixo de gastar as tintas.  







Alfredo Favacho (Tio Nem)



Após 8 meses de aposentado do BB, tomei posse no Banco da Amazônia, em Soure(PA), em chamado de concurso em que fui aprovado. Trabalhados os 2 primeiros meses recebi vales alimentação referentes aos 60 dias. Os trâmites da posse atrasavam esse primeiro recebimento. Fui ao maior supermercado da cidade para tentar trocar os vales por dinheiro, pois dificilmente eu compraria tanta mercadoria até receber novos vales. Até ofereci um percentual ao dono do supermercado. O comerciante olhou pra mim meio enviesado e de pronto se negou a realizar a transação, ficando presente um certo ar de desconfiança da parte dele. Meio frustrado, dei bom dia e me retirei. Lembrei-me do Tio Nem, que tem um Mercadinho no Bairro Novo, onde algumas vezes tomei umas geladas em baixo de uma frondosa mangueira de frente, em que ao redor do tronco foi estrategicamente colocado um quadrado de madeira para servir de assentos pelos fregueses e transeuntes. Bem dizer adotei a Mangueira para usufruto, pois dela quem cuidava era o Tio Nem. Fiz a mesma proposta dos vales e o Tio Nem prontamente me atendeu. Disse: “Amigo, tem um vendedor que me compra todos os vales que recebo de meus clientes e comprará os seus também”. “Semana que vem ela estará aqui”. Entreguei os vales e disse que quando ele trocasse me avisasse que eu iria lá tomar umas e receber o valor correspondente aos vales. Na Sexta-feira seguinte eu estava na Balsa para travessia com destino à Camará e Belém, quando chega o Tio Nem com todo o dinheiro e me entregou. Quis lhe dar um valor e ele se recusou a receber. Ganhou minha fidelidade como cliente e nos tornamos amigos até os dias de hoje. 




Selva!!!

Era o louco da ilha, ou o louco da aldeia? Não! Era o amigo Selva, cujo apelido ganhara quando fuzileiro naval em treinamento no CIGS – Centro de instrução de guerra na selva. Bravo e brioso soldado do Exército Brasileiro, teve sua carreira abreviada por causa de um acidente de automóvel em que faleceu um companheiro de farda e ele teve debilitada parte de suas faculdades mentais, mas não perdeu a sabedoria, bom humor, censo moral e cívico, em cujo barraco onde morava havia uma Bandeira do Brasil sempre hasteada. Viveu em Soure (PA), Ilha do Marajó, o resto de sua vida. E não foi pouco tempo. Amigo de todos os “Selva”, como tratava a todos, tive o privilégio de ser seu amigo. Então vejamos:
Ele não era pedinte, nem precisava ser, pois era mantido por familiares seus. Mas vez por outra pedia algum dinheiro emprestado ou mesmo dado, em cuja abordagem, dizia: “Selva! Me arranje ai R$ 10,00, pois estou a precisar e é melhor pedir do que roubar, né? – Analise esta tese!”, completava. Um dia eu estava com apenas R$ 5,00 e logo entreguei. Ele pegou, olhou em silêncio e ficou como se esperasse mais R$ 5,00. Eu disse: Tá tudo certo, Selva, eu perco e R$ 5,00 e você perde R$ 5,00. Rimos.

Num período em que vivi só (descasado), estava numa festa no Solar do Bola, numa mesa e sem companhia. De surpresa vi ser colocado sobre a mesa um suculento filé com fritas, o qual não havia pedido. Quando olhei para questionar o garçom, tive a surpresa de ver o Selva, que logo se antecipou: “Coma, pra você não ficar fraco”. Mas quem paga a conta? – Brinquei. Ele apontou para seu filho empresário que o acompanhava em mesa próxima que a convite do Selva, veio me cumprimentar. Pedi que o Selva sentasse à minha mesa, pedi mais uma taça ao garçom e comemos juntos o filé, como tira gosto de muitas geladas.

O Bar do Papagaio, por muito tempo foi o point. Um dia, ao som do Violão e Voz do saudoso Montanha, começamos a nos arriscar a cantar também. Montanha, sempre solícito, se esforçava para acompanhar e desfaçar o desafino de nossas vozes. Como sempre, ataquei de A Volta do Boêmio. Ofereci o microfone ao Selva, que não se fez de rogado e disse: “Selva, vou cantar, mas antes preciso fazer um “prólogo”. E disse tudo sobre uma bela música, antigo sucesso de Waldic Soriano e para surpresa de todos, cantou com belo e afinado vozeirão.

Não o conhecendo, ninguém perceberia sua leve deficiência mental, a não ser por algumas “viajadas”, não sei se voluntárias ou mesmo devido a sua saúde mental. Passados alguns dias sem ser visto na cidade, quando o encontrei, perguntei: Por onde andava, Selva? Ele: “Fui a Belém fazer um check-up e aproveitei pra ir a Roma ver a posse de Bento XVI”. Eu: Que legal! E a saúde, tá tudo bem? Coração, estomago, intestino, fígado, rins, próstata? Ele: “Tudo bem”. Eu: Mas você achou muito ruim o exame da próstata? Ele: “Não. Sendo só o dedo”.   





29 de jun. de 2024

O Sol da Esperança

Piauí terra da gente
És do grande Brasil
O pedaço mais discreto
Deste povo varonil

No teu solo duro e seco
Teu povo não esmorece
Trabalha de sol a sol
Enquanto a planta fenece

Vai chegar tua bonança
E todo teu povo vai rir
Com o teu justo porvir

A tua viva esperança
Do bom que há de vir
Não morre e não tem fim

Tarciso Coelho, junho/2002





24 de jun. de 2024

O Poeta

É nascido com o poeta
O bom gosto em rimar
Sua emoção não é secreta
E o seu prazer é amar

Jogando com as palavras
Mostra sua visão de mundo
E com poucas letras grava
Uma história num segundo 

O mundo é muito bom
Disso tenham certeza
Diz o poeta com firmeza

A sua arte pode ser dom
Mas com calma e leveza
Faz da palavra beleza






O Peixe


O peixe mais a peixa
Dentro d’água namorando
E um peixinho escutava
Aqueles dois falando

Eu estou de boca aberta
O seu beijo esperando
Por isso me beije logo
Porque a água tá entrando

Tarciso Coelho, agosto/2002






O Cachorro


Se você quer um amigo
Que mais dá do que lhe pede
E que amigo persevere
Mesmo quando ofendido
Não procure o bicho homem
Para tê-lo como amigo

Se quiser ter um amigo
Até mais que um humano
E que não traga desengano
Tenha um cachorro consigo
Em vez de ter amigo cachorro 
É melhor ter cachorro amigo

Tarciso Coelho, agosto/2002












O Homem Limpo e Puro



Do mundo não se queixe
O mundo não é mau
Há minoria de homens
De atuação anormal

Porém da lama imunda
Os Puros lírios nascem
Provando que no impuro
Os puros se sobressaem

Mesmo quando refletida
No mais sujo pantanal
A luz sempre é normal

O homem limpo e puro
Mesmo em meio mal
Limpo e puro entra e sai

Tarciso Coelho, 2002







O Banco do Brasil em 2026

O Banco do Brasil em 2026

O Banco vivia cheio
Da clientela abarrotado
Mas com o mundo mudou 
em sintonia com o mercado
e hoje é mais agradável
do que fora no passado

As agências são virtuais
O dinheiro também o é 
Nestes dias atuais 
Pra Maria ou pra José
O Banco parece ser
Um lugar de muita fé

Não é uma igreja
Nem qualquer religião
É apenas um lugar
Em que o povo tem atenção
Nem que seja virtual
Telepática ou mão a mão

A moeda de mais valor 
Não é dólar nem real
É um abraço especial
Que as pessoas se dão
Encostando peito a peito
E coração a coração

Tarciso Coelho
Previsão de como seria o Banco do Brasil em 2026 (Curso ACS Amana Key, Recife (PE), 2001).










O Batedor de Carteiras


No bolso a mão levou
Com leveza despercebida
Vinte reais me tirou
E disparou na corrida

O pouco vai me faltar
Mas se sua fome matou
E se rouba sem matar
A mim não desgostou

Tirou-me o que tinha
E sua fome matou
Porém nem me tocou

É claro não convinha
Mas se se alimentou
Meu perdão ele ganhou

Tarciso Coelho, 06.09.2003 






















Noite de Vigília



Enquanto tu dormias
Eu ficava a te olhar
Grande apetite eu sentia
Mas pude me controlar

Tua alcova devassar
Muito me constrangia
Optei por esperar
Tua concessão um dia

Estático fiquei
Mas vós te contorcíeis
E meu ser todo doía

Doía mas não pequei
Ainda estou a esperar
Um dia pra te amar

Tarciso Coelho, 1984





Minha Aposentadoria



Vou embora pro meu Ceará
Porque lá tenho um nome
Não sou Luiz com fome
E aqui não posso ficar

Foram vinte e nove anos
De trabalho no Banco
Aguentando firme no tranco
Como previam meus planos

Não pisei subordinado
Nem puxei saco de Chefe
Pois não sou um mequetrefe
Tenho muito é trabalhado

Hoje estou realizado
Com a missão cumprida
E mais uma vez de ida
Para o meu solo prezado

Pode ser seco e duro
Chover pouco e ser quente
Mas a sua boa gente
Acredita no futuro

Não estou indo pro escuro
Lá meu sol é bem mais claro
E banho de mar não é raro
Tenho a praia do futuro

Esta história teve começo
No Sertão Pernambucano
Setenta e seis era o ano
Até o dia não esqueço

Foi em trinta de dezembro
Tomei posse em Salgueiro
E não houve desespero
Isso é coisa que não lembro

Depois fui pra Juazeiro,
Parnamirim, Piancó
E nunca me senti só
Em dezembro ou janeiro
Manicoré me abraçou
Na nossa grande Amazônia
Pois digo sem parcimônia
Quem passou ali gostou

Retornando ao Pernambuco
Fui à São Vicente Férrer
E na volta não há quem erre
Se já não estiver caduco

Ali passei quatro anos
Até noventa e dois
Para AUDIT fui depois
Onde passei nove anos

Conheci todo o Brasil
À exceção de três estados
Que fui só aos seus lados
Mas suas terras não vi

Picos e Rio Branco
As duas últimas paradas
Talvez melhores estadas
Das que tive no meu Banco

Não esqueci Wanderley
Onde um dia fui adido
E na Bahia fui querido
Do seu povo que amei 

Aos colegas meu abraço
Aos clientes agradecimento
Pois não há esquecimento
Na lembrança sempre trago

Quem te ama de bom grado
Por tudo que me destes
Diz feliz um cabra da peste
Banco do Brasil muito obrigado!

6.596.285-0 Luiz Tarciso Coelho Bezerra

Julho, 2004








Lembranças de Manicoré (AM)




Em tempo de São João
O forró se ensaiava
Era providência maior
Que Dona Luzia tomava

Mas qualquer dia ou hora
Muito bom era dançar
Lá Boate Sovaco
e também pra namorar

Tomar umas com João Dodó
Era muito engraçado
Não havia coisa melhor
Que ouvir seu bate papo

Ir pro Atininga pescar
Era a maior terapia
Quando a coisa esquentava
Era pra lá que eu corria

No pedaço de Madeira
O homem que mais cheirava
Era Dr. Antonio Dentista
Que dente não arrancava

A pizza mais gostosa
Era a do lido bar
Que o velho Timm alemão
Bem sabia preparar

Pra pegar tucunaré
O melhor rio de lá
Era o grande Maici
Só de 8 quilos pra lá

Comer um bom churrasco
Só na Democracia
Quando Antonio Duarte
O bom assado fazia

O caldo de Bacurau
Melhor que eu comia
Era o que a amiga Tapuia
Em seu restaurante fazia

De noite depois da festa
Para ressaca tirar
Era na Dona Peruana
Que sopa eu ia tomar

Na casa dos amores
Tinham mulheres e dança
Mas só o que eu queria
Era abraçar Dona França

Tinha a Rua da Cachaça
Pra beber até pegar gastrite
Que o poeta a transformou
Na famosa Drink Street

Essas são lembranças
Que guardo sempre de lá
E dos meus grandes amigos
Continuo agora a falar

Antonio Sena se foi
Deus o tenha em bom lugar
Os outros ainda nem sei
Se todos estão por lá

Arindal, Adauto, Zé Vaz,
Dr. Antonio e Valdomiro,
Que tenham saúde e paz
São desejos deste amigo

De alguns outros biriteiros
Lembrar nomes não consigo
Porém são todos amigos
Que os levo sempre comigo

O Chico Pescador
disse que vai aí
pra pegar tucunaré
Nas águas do Maici

E para os versos findar
Digo a Dr. Antonio Medeiros
Só quando um dia voltar 
Ao Sindicato dos Biriteiros

Tarciso Coelho, 06.07.2002








Foi-se embora Patativa


Foi-se embora Patativa
Que cantava em Assaré
As coisas do seu sertão
Com muito amor e fé
Deixando órfã a nação
Dos poetas de cordel

Cantou coisas alegres
E as tristes protestou
Grande acervo deixando
Sobre o que considerou
No seu poder de mando
Na forma como rimou

Sorbone lhe estuda
Sob a regência do Cantel
Que aqui se encantou
Com o seu belo cordel
E para França levou
A obra do menestrel

Embora semi-analfabeto
Passou lição em doutor
Que mesmo tendo cultura
Sofria falta de amor
E à Patativa sem estudo
Sabedoria não faltou

Nasceu predestinado
Para fazer cantoria
Sobre o sofrido sertão
Como ele mesmo dizia
“Se outros cantam sua cidade”,
"Eu canto a roça que é minha".

Muito perdeu o Nordeste
Veremos tempos depois
Que nosso cabra da peste
Deste mundo se foi
No dia oito de julho
Do ano dois mil e dois 
Agora que está no céu
Ao lado do Pai maior
Cante o que é eterno
Ou o que achar melhor
Mas não esqueça o Ceará
E o Sertão que ficou só

Tarciso Coelho, julho/2002.





Festa de São João



Forró, xote e quadrilha
Tem no tempo de São João
Na festa a moça brilha
De namorado na mão

Tem fogueira, traque e bomba
Tem quem solte até balão
E também rojão que arromba
E abre buraco no chão

Vá brincar o seu São João
Sem fazer estripulia
Lembrando que soltar balão
Não faz parte da folia

Ele sobe bem brilhante
Causando grande ilusão
Mas só desce fumegante
Fazendo estrago no chão 

Soltar bomba rasga-lata
Não recomenda a razão
Pois o estrondo da rasgada
Pode arrancar a sua mão

Coma, brinque e dance
Beije a sua namorada
E à paz dê uma chance
Na festa tão animada

Fazendo só o que preste
Nunca faça danação
Pra ter vida sempre alegre
Peça ao Santo proteção.

Tarciso Coelho, Junho/2003  















Hora da Paz


Se tem a hora da guerra
Também tem a hora da paz
Quem atira no meio não erra
Mas a ninguém satisfaz
Melhores são versos e prosas
Nas revistas, TVs e jornais
E em vez de tiros; rosas,
Paz, saúde e felicidade,
Com coisas bem venturosas
Para o Mundo e a Humanidade...

Tarciso Coelho, 2002